
Andava pela casa e comecei a sentir um vazio, reparei que as batidas do meu coração ecoavam num vazio frio e cinzento.
Sabia que precisava procurar uma paixão para preenchê-lo...
Comecei a revirar os cantos da casa: _ Onde foi que perdi a última?
Arrastei os móveis, virei as estantes, foliei os livros, desarrumei as roupas, mexi em cada canto da casa... mas não encontrei nada!
Resolvi procurar no quintal. Remexi todo o jardim, arranquei flores e plantas, cavei a terra, rasguei os sacos de lixo, mexi até na comida do cachorro, subi na arvore e olhei em cada folha...mas nada aparecia!Se quer um vestígio.
Peguei as chaves do carro, mas antes de sair dirigindo, olhei o forro, debaixo dos bancos, no porta luvas, no porta malas, no motor, até no encaixe da chave, não achei.
Saí pelas ruas olhando em cada esquina, nas casas, nos bares.
Cheguei ao shopping e perguntei de loja em loja se ainda tinha paixão para vender. Era melhor ter uma comprada do que não ter nenhuma. Porém parecia que tinham acabado. Todas! Acabado! Só eu que não teria umazinha.
Voltei para casa em prantos, quando cheguei lembrei que não tinha procurado na internet, sentei-me logo no computador e fiquei uma... duas... três... quatro... horas procurando e só via: ESGOTADO!!
Não sei como caí da cadeira no chão, só chorava como se a vida tivesse acabado.
Entre o som das lágrimas batendo no piso, ouvi o suave tilintar do bater de asas e logo em seguida senti um toque leve como uma pluma em meu braço.
Ela aparecera! Uma linda borboleta de desenhos negros entre o azul inebriante de suas asas.
As lágrimas estancaram e o sorriso voltou, corria pela casa acompanhado seus lindos vôos. O tom celeste de suas asas refletia a luz do sol e enchia os cômodos de cor!
Vi que por várias vezes ela saia da casa, demorava e retornava. Com medo que fosse embora fechei as portas, janelas e basculantes. Ela continuou a voar pela casa, contudo por inúmeras vezes se escondia atrás dos móveis e só aparecia quando queria. Resolvi nos trancar dentro do quarto, esperei a noite chegar, quando ela veio adormecer pousada em minha cabeceira fechei a porta e não abri mais.
Como da outra vez não houve nenhuma reclamação, todavia ainda se escondia atrás do armário ou entre minhas roupas, mas eu a queria perto de mim o tempo todo.
Peguei um pote de vidro, esperei que pousasse em meu dedo e delicadamente a coloquei lá dentro e fechei. Fechei o pote com tanta força que nem eu conseguiria abrir novamente, agora tinha minha paixão por perto sempre.
Por um tempo ela continuou a voar ali dentro, mas vagarosamente foi ficando quieta num canto, seu azul já não brilhava mais e um dia reparei que não se movia. Quebrei o pote a retirei de lá com pressa, mas já era tarde, estava morta. Me lastimei, gritei, esperneei!
Abri suas asas e com um alfinete a coloquei junto com as outras, algumas eram todas negras, outra coloridas, marrons, cinzentas, e agora uma azul.
O vazio foi voltando e abri a porta do quarto, as janelas da casa, a porta da entrada, os basculantes da cozinha e do banheiro. Sentei na sala sentindo aquela solidão me assolar. Quando no parapeito da janela pousara uma borboleta, maior do que todas as que eu já havia visto, com uma coloração de tons de lilás incomparável com qualquer obra de arte.
Aproximei-me lentamente e ela veio ao meu encontro. Começamos a voar juntas pela casa, pelo jardim.
Ela não se escondia, avisava de ia voar por aí e depois voltava.
Falei que me sentia sozinha sem ela, mas me disse que estaria sempre comigo, dentro do meu coração.
Chamei o chaveiro e mandei tirar todas as trancas da casa, nunca mais fecharia uma porta ou janela.
Com o tempo outras começaram a entrar, vinham muitas, minha casa parecia o recanto das paixões. Eram rosas, amarelas, verdes, azuis, marrons, todas as cores.
Nenhuma como a lilás, mas que me faziam feliz também.
Descobri então que as paixões não deveriam ficar empalhadas em uma parede, tinham que ficar livres, se fossem minhas estariam sempre comigo, se não fossem passariam e se tornariam boas lembranças.
Hoje não fecho nem os olhos, pode ser que alguma passe eu não veja.